As casas, para mim, têm que ter vida própria e contar estórias.
Não vivo sem os riscos na madeira das mesas e das portas que me fazem lembrar momentos…"sacana do puto que já me fez outro risco na mesa", "este gajo deve ser parvo, pensa que está na casa dele".
Gosto de perder o olhar nos objectos que contam viagens, descobertas, achados, regateares de preços nas feiras e momentos bons ou que o foram mas não voltarão a ser, ou que poderão ainda ser melhores.
Gosto do calor e do aconchego de camas despenteadas e às vezes da frescura de camas lisas com cheiro a lavado.
Não gosto de louça suja nas cozinhas, nem de máquinas de a lavar, gosto de ser eu a mexer na água, também para me limpar de gorduras incómodas e deixar a transparência, merecida, nos meus copos.
As fruteiras são para estar coloridas, ainda que não se comam os frutos por preguiça ou esquecimento.
Incomodam-me a ausência de 15 anos de CDs na estante de alvenaria da sala e os copos elegantes e finos de vinho que o pai do filho levou. Não consigo repor a música, música assim de tantos anos não se consegue repor de uma assentada, vai-se repondo...
Os copos, esses ainda estão em falta e acabam sempre por me causar uma alegria interior esquisita, malvada, quando me falham, fazem-me pensar "aquele cabrão não tinha nada que ter levado os copos" e também porque gosto de imperfeições e de deixar a responsabilidade e a diversão da escolha dos que melhor se adequam ao cuidado das visitas.
Incomoda-me, mas preciso da desordem do quarto do filho que me provoca invariavelmente frases enervadas e enervantes "que vergonha, ISTO parece uma pocilga", ou, "se não arrumas ISTO rapidamente entro em modo de histeria e depois, não te queixes!", mas que me fazem tomar consciência de que tenho um filho adolescente e que ISTO é ter um filho e que eu também já fui filha em casa de pais e desarrumar é bom e arrumar, nem tanto.
Gosto do cheiro da roupa lavada que me provoca sorrisos e não gosto do cheiro da terra molhada que me dá a sensação de falta de dar.
Com calor adoro beber cervejas frescas no quintal, e com o frio chás de ervas quentes enfiada na cama ou um copo de vinho tinto saboreado na sala.
Gosto de calcular os centímetros que a minha nespereira cresceu em 4 anos e maldizer entre dentes as ervas que crescem todos os dias sem esperança de frutos saborosos.
Fascinar-me com a luminosidade do amarelo da árvore das traseiras e o vermelho da árvore bonita e chata que me invade o quarto de salpicos pela janela.
Para lá do muro das traseiras não passo sem a alfarrobeira centenária que roça o céu em tamanho e em beleza e que por tanto a amar deveria ser minha e estar do lado de cá.
Gosto da minha casa, gosto pois! De ler as minhas estórias todos os dias.
Gosto também de adivinhar os outros nas suas casas.
A menina casa?
Definitivamente, NÃO!
16 comentários:
Música fixe! :))))
Jocas
A.Sabão
Porra! Tu não me digas que tiveste preguiça de ler o post?
;P
Tu tás com a febre do post :)
Por razões inconfessáveis não me apetece falar em casas ;P
Gostaste da Laurie Anderson?
Anocas:
Adorei a maneira como descreveste a tua casa. mas mais do que descreveres a casa, tu descreveste uma coisa muito mais importante... o teu Lar!.
Revi-me em algumas passagens e alguns gostos, noutros sou o teu oposto ;)
Eu gostei do texto. Uma casa tem que ter alma. Mas também não esquecer que as casas evoluem, tal como os seres vivos...
Pronúncia
O meu lar, é isso mesmo. Emprego o termo casa porque gosto mais, é mais forte.
Quase que consigo adivinhar nos que és o meu oposto...a cama despenteada, o lavar da louça, o cheiro a terra...será por aí!?
(Devo estar com a mania que sou bruxa, ahahahah)
:P
Pulha Garcia
As casas evoluem, crescem connosco, contam mais estórias a cada dia que passa...
A alma delas passa a confundir-se com a nossa. Têm vida!
LBJ
'Tou nada! Tenho é que aproveitar os momentos de inspiração que nos dias que correm são raros.
Pronto, não precisas de te confessar...hummmmmmm??????
A Laurie Anderson, que maluquice! Adorei! A ilha, a serpente...que forma diferente de "falar" a paixão.
Onde raio descobres tu estas coisas menino Jesus?
Ana, és quase bruxa! É mesmo por aí... sem a cama despenteada que essa não me chateia muito (só um bocadinho). Agora lavar louça... grrr! Dispenso, é para isso que foram inventadas as máquinas.
Cheiro a terra molhada, depois de uma chuva intensa, num dia quente... ADORO! ;D
Pronúncia
Eu sabia!!!!
Mais dia menos dia abro um consultório de bruxarias e cachorros quentes.
:D
Olha, podemos ser sócias... também tenho o meu quê de bruxinha!
Melhor, fazemos um franshising... uma loja, no Norte, outra no Sul estão garantidas ;D
Pronúncia
Uma loja no Norte e outra no Sul, bem pensado. Até já estou a imaginar o néon na fachada principal..."As Bruxas Marafadas"
Ahahahah!
Ana, até já fiz uma prospecção de mercado... é uma profissão rentável em tempo de crise.
Vê aqui http://pronuncianorte.blogspot.com/2009/04/profissoes-rentaveis-em-tempos-de-crise.html
Pronúncia
Lembrei-me dele (texto) assim que falaste em bruxas.
Acho mesmo que será uma profissão rentável sempre, com ou sem crise. Vou amadurecer a ideia.
;)
GG: é bom não é ? Estarmos lá... estando, cheirando, sentindo e vivendo ? In a way ... tenho uma casa cheia de coisas de gente também...
Red
É boa a sensação de estarmos nas nossas casas com coisas de gente...
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